Um Abismo

segunda-feira, julho 31, 2006

Perto do céu

brinco nesta tarde com as nuvens mais leves
faço bonecos macios atiro-me para cima
das flores persigo os gatos
nos telhados e fico
mais perto do céu

não nos sobra terra onde rolar
neste verão escuro

quarta-feira, julho 26, 2006

Perdia-me com asas

se eu tivesse asas
perdia-me entre os jacarandás
e não te deixava as mãos
a secar estendidas às tuas

não tas dava para sangrares
as papoilas

se eu tivesse medo
não te dava um postal
de flores

segunda-feira, julho 24, 2006

Carne volátil

amo a tempestade que provocas as lágrimas
que acendes esta fúria
esta corrida picada
este ninho aberto
estas veias ao vento
este caminho de toupeira amo
amo o suor do pensamento
a raiva com que aceito o beijo
a lisura dos cabelos depois
das tuas mãos e amo
amo amo outra vez a cirurgia
dos teus dedos na minha carne
volátil

o que tu abres fecha-me do mundo

terça-feira, julho 18, 2006

Momento exterior

encho-me do último bolor e à janela
vejo figos perco-me
numa argola de fumo e quero
saber se posso cair cantanto-te
contra as paredes do prédio

sob o fluxo do rio o vento
inicia-te____perfil fechado da flor

e usas o grito
e bebes se atiro sangue
morres: peito chamando-me clamando-me

então dou-te as minhas ruas
uma carga de nervos trocados
veias invertidas e num pino nu
curvo-me aberta
à tua cintura

terça-feira, julho 11, 2006

Abre uma porta

comes onde o sol não me pintou e transformas
em mel todos os líquidos aprisionados
no corpo
do sangue fazes magia
do sémen alegria

entre um dedo e outro
o escuro triângulo abre uma porta
para o templo__________coração
onde te guardo

à entrada está uma uva rubra

comes
o sol nunca a tocou

sexta-feira, julho 07, 2006

Ací no hi ha paper

I
ací no hi ha paper
escric el poema en les línies
del cos

II
em descolle pels genolls
i deixe entrar el teu
cor

III
els meus braços envoltant-te el bescoll
els teus llavis nus els meus cabells

el llit és excessiu
perquè suguem nomès un

IV
l' edat illumina
em trau
veus
m'aixeca les sines
- declivis nocturns
sota la claredat dels teus dits

em done a les mans
renaixents

Tradução de Pere Bessó

quinta-feira, julho 06, 2006

Aqui não há papel

I
aqui não há papel
escrevo o poema nas linhas
do corpo

II
descolo-me pelos joelhos
e deixo entrar o teu

coração

III
os meus braços à volta do teu pescoço
os teus teus lábios nus meus cabelos

a cama é excessiva
para sermos só um

IV
a idade ilumina
tira-me véus
eleva-me os seios
- declives nocturnos
sob a claridade dos teus dedos

dou-me às mãos
renascentes